*Com Flávio Calife, economista da Boa Vista
Setenta e um por cento dos pequenos empresários brasileiros reconhecem que os custos variam de acordo com o meio de pagamento utilizado na venda. É o que mostra pesquisa divulgada recentemente pelo Sebrae.
De fato, por trás da aceitação de cartões, por exemplo, há o custo do aluguel ou da compra da maquininha.
Além disso, sobre o valor de cada venda realizada na modalidade há a incidência de uma taxa – a taxa de desconto, cuja média de mercado era de cerca de 1,6% em 2017, no caso dos cartões de débito, e de 2,6% no caso do crédito, de acordo com dados do Banco Central. Para os pequenos negócios, vale ressaltar, as taxas costumam ser maiores.
Além das despesas com a maquininha e a taxa de desconto, as transações com cartão de crédito geram um custo adicional para o comerciante, que recebe o valor somente 30 dias, em média, após a venda, contra cerca de 2 dias no caso do débito.
No caso das vendas parceladas, além de receber o valor da venda também em parcelas, a taxa de desconto cobrada costuma ser ainda maior.
Não é à toa, portanto, que 80% dos pequenos empresários entrevistados pelo Sebrae apontaram o cartão de crédito como o meio de pagamento com maior custo.
Já 10% apontaram o boleto bancário; 6%, o cheque; 3%, o cartão de débito e apenas 1%, o dinheiro.
Engana-se, porém, quem acredita que não há custos relacionados às vendas em dinheiro. Além do tempo gasto para realização dos depósitos em uma conta bancária, há riscos e despesas associados a controle, fraude e segurança. No caso dos cartões, os valores são depositados diretamente na conta do cliente.
Já no caso dos cheques – cuja utilização é cada vez menos frequente, diga-se de passagem –, o risco de inadimplência é do próprio comerciante, enquanto o recebimento das vendas no cartão é garantido e a avaliação de crédito fica por conta do banco emissor do plástico que realizou a transação.
Levando em consideração a diferença dos custos associados a cada meio de pagamento, foi sancionada em junho de 2017 a lei que possibilita a cobrança de preços diferenciados de acordo com o prazo e o meio de pagamento.
A nova legislação, porém, ainda não é plenamente conhecida pelos pequenos empresários brasileiros. De acordo com a mesma pesquisa do Sebrae, somente 56% dos entrevistados tinham conhecimento da lei.
Entre os que tinham conhecimento, 51% praticavam sempre, quase sempre ou às vezes preços diferentes de acordo com o meio de pagamento utilizado, contra 43% entre os que não conheciam a legislação.
A proximidade dos números sugere que a prática de descontos já era observada no comércio mesmo antes da aprovação da lei.
58% dos entrevistados disseram que os clientes sempre pedem desconto para pagamento à vista. 27% disseram que pedem às vezes e apenas 15% responderam que os clientes nunca pedem descontos nestes casos.
Quando os clientes pedem desconto para pagamento à vista, 65% dos entrevistados costumam sempre dar desconto, contra 31% que dão às vezes e apenas 4% que nunca abaixam os preços.
Ou seja, pode-se dizer que a prática de cobrar preços menores para pagamento à vista é relativamente frequente no pequeno comércio.
Embora não haja dados disponíveis, a impressão é que esta prática é bem menos comum nas grandes redes varejistas. Há pelo menos duas explicações para isto.
Em primeiro lugar, as grandes redes, por movimentarem maiores volumes financeiros, têm maior poder de barganha junto às credenciadoras de cartão e bancos, de forma que conseguem negociar taxas de desconto e de antecipação de recebíveis menores.
As despesas com a operação de cartão, com isso, podem inclusive ser inferiores aos custos relacionados a controle (contagem, recontagem e armazenagem), transporte de valores e tempo gasto na realização de depósitos e busca de troco, caso as vendas fossem realizadas em dinheiro.
Outra explicação pode estar ligada a uma estratégia comercial que se aproveita de conhecimentos da economia comportamental: um cliente que gasta um valor próximo de R$ 1 mil à vista em uma loja de roupas, por exemplo, pode relutar em retornar tão cedo àquela loja, pois voltou para casa com a sensação de que gastou demais; caso a compra seja realizada em 10 parcelas “sem juros” de R$ 100, ele pode ficar com a sensação de que não gastou tanto e, assim, retornar à loja em breve e acrescentar à fatura uma nova parcela de R$ 100 ao mês.
Para o pequeno comércio, por outro lado, a diferenciação de preço de acordo com o meio de pagamento pode colaborar tanto para a redução de despesas como para a gestão do fluxo de caixa.
Pode ser por isso que, também segundo a pesquisa do Sebrae, 70% dos micro e pequenos empresários entrevistados em 2018 dão desconto para pagamento em dinheiro ao invés de cartão – em 2016, o percentual era de 53%.
Para um consumidor que tem controle do orçamento, por sua vez, o parcelamento das compras é sempre um bom negócio caso não haja desconto para pagamento à vista.
Já para um consumidor que costuma se atrapalhar com as próprias finanças, é preciso tomar cuidado para que mais e mais parcelas não acabem se transformando em uma dívida impagável.
Mas tanto em um caso como no outro, sempre valerá a pergunta: à vista tem desconto?
Fonte: Diário do Comércio