Organize sua empresa para enfrentar a crise

Organize sua empresa para enfrentar a crise

“Enquanto uns choram, outros vendem lenços”. A frase, de tão utilizada, quase sai em tons de cinza no meu editor de texto, mas, nem por isso, perde veracidade e poder.

É o que acontece com todo princípio: imortais, rompem as eras trocando apenas de roupagem. De fato, mesmo em tempos de crise, dinheiro não “desaparece”, apenas troca de mãos. Não existe crise para todos ao mesmo tempo – nem no cenário sci-fi em que nos encontramos. E essa é a primeira máxima que você não pode perder de vista: tome o leme e conduza o barco, ao invés de ficar paralisado esperando que a tempestade o afunde. Enquanto higieniza suas mãos durante 20 segundos, conforme recomendação OMS, cantarole o refrão de I Will Survive, que tem a mesma duração. A sobrevivência do seu negócio começa, antes de mais nada, na sua firme decisão de não o deixar morrer.

Definido o destino (chegar à outra margem, no pós-crise), precisamos traçar o nosso mapa de navegação estratégica. Por onde começar?

Há alguns anos, desenvolvi um pensamento estratégico empresarial chamado Metodologia PRO, que representa os 3 princípios elementares da gestão sustentável, de acordo com a minha expertise: Pessoas; Recursos; e Organização. Tomando estes pilares como coordenadas primárias do nosso Plano de Ação Emergencial, precisamos agora definir medidas práticas a serem adotadas em cada uma dessas frentes. As ideias a seguir são apenas exemplificativas, exercícios mentais para te auxiliar a decidir por onde começar a desatar os nós da sua empresa nesse cenário de total atipicidade.

Lembre-se: ninguém conhece melhor a sua empresa do que você e a sua equipe gestora! Portanto, compartilhe esse texto e envolva-os no planejamento de contingência.

Quanto às Pessoas: se fosse para eleger o mais importante dos 3 princípios apresentados, não tenho dúvida nenhuma de que seria esse. Afinal, uma pessoa sem nenhum Recurso ou Organização pode prestar um serviço e gerar valor. No entanto, na maioria das vezes em que falo do tema, o empresariado tende a pensar exclusivamente nas pessoas físicas que compõem a sua equipe. Ao trabalhar essa variável, precisamos de muito mais profundidade, nos aproximando do conceito dos stakeholders, ou seja, de todas as pessoas físicas e jurídicas interessadas que devem estar de acordo com as práticas de governança corporativa executadas pela empresa.

Devemos ainda, para fins estratégicos, dividi-los em “interessados internos” (sua equipe, dividida em núcleos: colaboradores; gestores e diretores; e proprietários e acionistas); e “interessados externos” (fornecedores; sociedade; governo; credores; clientes; entre outros). Elenque todos os players que participam da cadeia do seu negócio e defina ações para cada um deles. Por exemplo, em relação aos colaboradores: consigo dar férias para quais funcionários?; precisarei fazer cortes na equipe?; preciso contratar ferramentas de teletrabalho?; preciso promover um treinamento destas ferramentas?; e por aí vai.

Quanto mais perguntas os planejadores se fizerem, mais completo e eficaz será o Plano de Ação. Definidas as medidas, não cometa o principal erro dos gestores de pessoas ineficazes: o que os ouvidos não escutam, o coração sente. Portanto, comunique-se, compartimentalizando a informação (comunicar-se sempre e com todos, na medida do que cada um precisa saber).

Quanto aos Recursos: nessa frente, pense simples e aja rápido. Não é o momento para investimentos voláteis ou complexos, especialmente os que dependem de vários fatores externos. Buscar alta rentabilidade rapidamente vai sempre elevar a exposição ao risco, portanto, se quiser experimentar ganhos especulando com a crise, algo inerente ao período, a sugestão é blindar muito bem o seu negócio e faze-lo na pessoa física. No saneamento desta área, o empresário deve manter o mindset de Fluxo de Caixa, definindo ações em 3 campos: CaP – Contas a Pagar; CaR – Contas a Receber; e Giro.

Nas CaP, a dica é postergar todos os pagamentos possíveis, renegocie todas as datas tendo a crise como justificativa mais do que plausível e o horizonte previsto pelo Ministério da Saúde como seu objetivo ideal de rolagem (20 semanas, ou seja, 140 dias de atipicidade). Analise todas as contas pendentes nesse período e corte e/ou reduza os gastos adotando o “mínimo possível” como filosofia de vida do seu negócio. Se precisar declarar mora, comece pelos tributos e deixe fornecedores e colaboradores, nessa ordem, como última opção antes de fechar as portas.

Nas CaR, o processo é exatamente o inverso. Sensibilize seus devedores com o cenário, especialmente os inadimplentes, promovendo descontos e condições favoráveis para que fiquem em dia – o interesse é todo seu em um Caixa com a maior gordura possível. No Giro, a meta, mais do que “girar”, deve ser gerar reservas. Reveja todos os seus investimentos e realoque para opções de maior liquidez, mesmo que sacrificando a rentabilidade. Outra boa pedida é, considerando o atual cenário, negociar ativos de valor não essenciais à rotina do negócio, como veículos, terrenos e imóveis, que poderão ser recomprados a condições favoráveis em um mercado buscando a retomada financeira no pós-crise.

Quanto à Organização: por último, mas não menos importante, transforme tudo em Projeto. Eleja a Comissão do Planejamento de Contingência (até mesmo o Rei Salomão, considerado o mais sábio entre os homens pelos ocidentais, possuía uma extensa equipe de conselheiros); a metodologia (pode ser algo simples e eficaz como o 5W2H, em uma planilha: O Quê; Quem; Onde; Por Quê; Quando; Como; Quanto; acrescido de uma coluna de Status: a realizar; em andamento; pausado; realizado); e a ferramenta de acompanhamento (há uma infinitude de opções pagas e gratuitas na internet, como Trello, Asana e Monday.com).

Se tem uma área ou gestor de Projetos na sua empresa ou pagou um curso para alguém da TI ou da Qualidade, por exemplo, traga esse recurso para a Comissão – o momento é mais do que propício para o uso desta expertise. No microcenário, ao organizar a prioridade de cada ação considerando apenas o ecossistema da sua empresa, pense simples (mais uma vez) e comece pelas coisas primeiras.

Um exemplo prático: decretou aos colaboradores o teletrabalho; definiu quais as ferramentas e formas de acesso seguros?; haverá diferentes ferramentas, mais adequadas às rotinas de determinada equipe ou ao perfil/tipo de interação?; treinou a equipe no uso das ferramentas e validou o aprendizado?; disponibilizou suporte, alternativas e/ou responsáveis em caso de dificuldades técnicas?; etc.

Claro que estou extremando o raciocínio, mas o pecado saudável é sempre o que majora os riscos e dificuldades, nunca o contrário. Defina ainda quem desempenhará o papel de Gestor de Crises, aquele que assumirá a liderança da elaboração e execução do Planejamento de Contingência, bem como a interface com os stakeholders.

A presença de um professional triber, o especialista na integração das várias competências de uma empresa entre si e com o mercado, também é bem-vinda, garantindo maior assertividade das estratégias (é o responsável por pensar fora da caixa conhecendo as ferramentas da caixa), vale a contratação, caso não tenha esse recurso internamente.

Falando do lado de fora da caixa, lembre-se de considerá-lo na elaboração da estratégia: há diferentes benefícios e restrições nas esferas federal, estadual e municipal trazendo importantes variáveis ao planejamento. Não queira pensar como um negócio paulista estando em Mato Grosso do Sul e nem como uma empresa campo-grandense estando em Maracaju. Há modo e tempo para todas as coisas e, num adendo pertinente à máxima bíblica: “basta a cada dia, a cada cidade, a cada segmento e a cada negócio, o seu mal”. E a dica de ouro: corra atrás de know how altamente qualificado no mercado a preços de “o gerente ficou louco”. Há uma série de consultorias especializadas (como por exemplo, o Tax Group), outrora verdadeiras fortunas, flexibilizando a contratação e o pagamento ao êxito e efetiva implementação de caixa.

Finalizo desejando, sinceramente, que estas dicas possam ter renovado o seu espírito empreendedor e te convencido que há luz no fim do túnel, basta continuar cavando. Então, arregace as mangas, lave bem as mãos, cante mais uma vez o refrão de I Will Survive, e mãos à obra!

Thiago Moura – Diretor de Marketing e Operações em Santana e Haddad Advogados, e sócio-diretor de Negócios em Nest Soluções.

Fonte: Nest Soluções