Segundo levantamento do Kantar Ibope Media, 6% dos brasileiros que usam internet já transitam por alguma versão do metaverso -o que equivale a quase 5 milhões de pessoas. Globalmente falando, a consultoria Gartner prevê que, em 2026, um em cada quatro usuários de internet vai gastar ao menos uma hora por dia nesses mundos virtuais.
Isso abre um espaço inimaginável de negócios para o varejo, tão grande (ou até maior) do que o e-commerce. Pelo que se pode ver dos principais players do mundo, 2022 será o ano em que as marcas vão testar as possibilidades desse novo espaço. Nos cálculos da Bloomberg Intelligence, isso deve movimentar cerca de US$ 800 bilhões até 2024.
Potencial real das novas tecnologias
O burburinho em torno desses mundos que estão emergindo a partir da indústria de games baseia-se no potencial (bem real) das tecnologias de realidade virtual e aumentada (RV e RA) de transformar a maneira como os consumidores compram e se relacionam com as marcas, tanto na internet quanto no mundo físico.
Por outro lado, especialistas avaliam que ainda há um bom caminho a percorrer antes de comprarmos roupas, carros ou viagens em um ambiente totalmente virtual.
“Nos anos 90, não sabíamos o que viria a ser a internet. Estamos no mesmo ponto em relação ao metaverso. Especulando, falando das plataformas, das possibilidades de comercialização, mas ainda não sabemos o potencial disso”, declara Ulisses Zamboni, fundador da agência de comunicação Santa Clara -entrevistado do programa Mídia e Marketing desta semana.
A falta do ‘botãozinho’ de compra
A incerteza não tem se mostrado um empecilho para marcas mais inovadoras. Adidas, Forever 21, Gucci, Louis Vuitton, Nike, Ralph Lauren, Vans e Zara já realizaram ações no “novo mundo”. No Brasil, O Boticário criou uma loja no game Avakin Life, onde os jogadores podem resgatar prêmios em itens da marca e pedir ajuda a uma consultora virtual para entender mais sobre ativações no jogo.
“Várias marcas têm nos procurando para construir minimetaversos que se conectem aos seus sites. Isso já proporciona uma imersão, mesmo que pequena, nesse tipo de experiência, e gera relacionamento com o usuário”, diz Eva Lazarin, sócia-diretora da Benkyou, empresa especializada em treinamento e capacitação ligada ao grupo Gouvêa, que desenvolveu o projeto de O Boticário no Avakin.
“Por enquanto, as marcas estão usando o metaverso para fazer relacionamento e gerar tráfego para suas lojas na hora de fechar negócio. O que falta é criar o ‘botãozinho’ para que as pessoas possam comprar lá dentro, diretamente”, afirma Eva.
Desafios e disposição
“São dois desafios: o primeiro é ter uma infraestrutura robusta de blockchain, porque a plataforma precisa ser muito segura para fazer transações financeiras. O segundo tem a ver com a questão da criatividade, de modelos de negócio que sobreviva nesse ambiente. Que produtos e serviços serão oferecidos? Para quem? Como estruturar uma operação de varejo, que seja rentável no metaverso? Iremos na base da tentativa e erro”, declara Zamboni.
Do lado do consumidor, há questões relativas ao acesso e ao comportamento do público. Os dispositivos para navegação em ambientes 3D ainda são caros e pouco confortáveis. Um bom par de óculos de realidade virtual custa entre R$ 2.000 e R$ 4.000. Para Eva, o acesso vai se dar, majoritariamente, por meio de celulares e computadores.
Mesmo assim, disposição parece não faltar. Segundo a consultoria eMarketer, 27% dos norte-americanos que usam a internet se interessariam em experimentar RA/RV para comprar roupas, 23% para móveis e 22% para utilidade domésticas e produtos de tecnologia.
Vender o quê para quem?
“Nem todo mundo gosta de usar óculos RV, não é algo natural. Ele proporciona uma experiência melhor, mas não será o dispositivo que vai popularizar o metaverso. Teremos essa experiência, com certeza, através dos aparelhos tradicionais: computador e celular”, afirma a diretora da Benkyou.
Navegar no metaverso não é só uma questão de acesso à tecnologia, mas também (e talvez, principalmente) de estar familiarizado com ela. Por isso, investimentos no metaverso comercial só deverão ganhar escala conforme as gerações Z e Alpha (nascidos a partir de 2000 e 2010, respectivamente) forem ganhando poder de compra.
Mais que nativos digitais, esses jovens não conhecem o mundo sem redes sociais e estão crescendo imersos em experiências online -dois terços dos usuários do Roblox têm menos de 16 anos. Alphas e Zs serão metade da população mundial em 2030 e seu comportamento de consumo é diferente do das gerações anteriores. Para eles, o mundo é phygital, a mistura de físico com digital.
Lojas virtuais serão apenas o ponto de partida para a exploração de novos canais de vendas e relacionamento com o consumidor. Nesse sentido, o metaverso dará aos varejistas a chance de reimaginar o negócio livre dos limites das fronteiras físicas. Um verdadeiro playground para as marcas ampliarem seu alcance com narrativas digitais imersivas.