O ministro da Fazenda, Fernando Haddad (PT), afirmou, nesta segunda-feira (13), que a reforma tributária sobre o consumo, caso aprovada pelo Congresso Nacional, provocará um “choque de eficiência” inestimável para a economia brasileira.
A expectativa do governo é votar a Proposta de Emenda à Constituição (PEC) entre junho e julho na Câmara dos Deputados e até outubro no Senado Federal.
“A reforma proposta vai pôr fim a um enorme conflito distributivo no país: público-privado e público-público. Isso vai nos dar um horizonte de sustentabilidade muito maior do que temos hoje, uma segurança jurídica muito maior, vai eliminar desonerações completamente arbitrárias que foram feitas com base no capitalismo de compadrio, que tem que acabar no Brasil, e vamos ter transparência, saber de onde está indo e para onde está indo o dinheiro público”, afirmou o ministro.
“O choque de eficiência que ela vai dar na economia brasileira não é possível estimar neste momento de tão grande que será. Fala-se em algo entre 10% e 20% de choque do PIB, mas penso que vamos facilitar muito a vida dos investidores, dos trabalhadores e do poder público com essa perspectiva. E ninguém pode usar como pretexto que vai perder ou vai ganhar, porque todos os prazos estão sendo calibrados para que a gente tenha uma aterrissagem suave, mas que impacte diretamente o contribuinte. O contribuinte tem que ter clareza da regra do jogo”, prosseguiu.
O ministro participou do evento “E agora, Brasil? A reforma tributária e os desafios econômicos do Brasil”, realizado pelos jornais O Globo e Valor Econômico, em Brasília, com patrocínio do Sistema Comércio.
Durante o evento, Haddad minimizou as resistências de prefeitos e alguns governadores, preocupados com possível perda de arrecadação ou atratividade para empresários e investidores, e do próprio setor de serviços, que teme uma elevação de carga tributária para compensar uma esperada redução de impacto sobre a indústria.
“[O sistema atual] Está punindo o investidor, punindo o exportador, o industrial, as famílias de baixa renda, que consomem mais produtos industriais do que serviços. E, além de tudo, está punindo o próprio setor público, dada a litigiosidade dos tributos no nosso Poder Judiciário. O campeão é o ICMS, mas o PIS/Cofins não fica atrás e o ISS, depois de um grande trabalho de mais de 20 anos de aperfeiçoamento da legislação, também começa a arrumar”, continuou.
Haddad citou como trunfo de sua gestão o êxito no acordo com os 27 governadores para compensar as perdas de ICMS provocadas por duas leis complementares aprovadas pelo Congresso Nacional na última legislatura, com patrocínio do governo de Jair Bolsonaro (PL). A solução costurada envolveu uma compensação de R$ 26,9 bilhões pela União aos entes subnacionais.
Durante o evento, Haddad ressaltou a manifestação de apoio, por meio de carta, dos sete governadores das regiões Sul e Sudeste à reforma tributária. E disse que o tema só não foi aprovado pela gestão anterior por falta de vontade.
Em relação à resistência de prefeitos de grandes municípios, que arrecadam ISS e temem perder recursos caso a versão em discussão da reforma tributária prospere, o ministro disse que as arestas podem ser perfeitamente aparadas.
“O ISS é cerca de 10% do ICMS, se considerar arrecadação e desonerações. Se somar o que se arrecada de ICMS e o que não se arrecada por desoneração, estamos falando de quase R$ 1 trilhão. A arrecadação de ISS é R$ 100 bilhões. Pegue o que é arrecadado, a cota-parte de ICMS que vai aos municípios é quase o dobro de todo o ISS arrecadado. Se você verificar, o ISS que vai ficar no mesmo lugar é muito mais do que 80% da arrecadação. O Supersimples atinge 80% dos serviços. Então, tudo somado, quando você coloca na ponta do lápis, você afasta os fantasmas do que vai acontecer”, disse.
“Por isso que ela (a reforma) está ganhando torque, impulso. Confio muito na nossa capacidade de convencer”, pontuou.
Confrontado com a percepção de que o setor de serviços será penalizado por um aumento de carga tributária caso a reforma seja aprovada, Haddad questionou os cálculos apresentados pelo segmento e colocou sua equipe, liderada pelo economista Bernard Appy, secretário extraordinário de Reforma Tributária no Ministério da Fazenda, à disposição.
“A indústria hoje responde por 11% do PIB e 30% da arrecadação de impostos. O bom é que o setor de serviços responde por muito mais do PIB. Então, quando você acomoda as alíquotas, querendo favorecer a indústria, sobretudo a exportação de manufaturados, haverá uma diluição disso. Outra coisa que serviços precisa considerar é que ele não se credita de tudo. E ele passará a se creditar. Depois, quando serviços está no meio da cadeia, ele está incorporado à cadeia. Ele tem um sistema de crédito e débito que não tem nem como impactar 188%, porque matematicamente a conta não fecha”, disse.
Em diversos momentos da conversa, Haddad também destacou que a reforma tributária sobre impostos indiretos (aqueles que incidem sobre o consumo, maior faixa de tributação no Brasil) terá impacto geral neutro – ou seja, não implicará em um aumento ou diminuição ao geral pago pelos contribuintes.
“Não pretendemos aumentar imposto sobre consumo, porque no Brasil ele já é muito alto. Na verdade, deveríamos planejar, no médio e longo prazo, uma mudança da composição da cesta de tributos, que deveria recair mais sobre renda e menos sobre consumo, como é a tendência internacional”, disse.
Segundo Haddad, a expectativa do governo é votar a matéria entre junho e julho na Câmara dos Deputados e até outubro no Senado Federal. Por se tratar de PEC, o texto precisa do apoio de 3/5 em dois turnos de votação em cada casa legislativa (ou seja, 308 deputados e 49 senadores).
Somente superada esta etapa é que o governo entrará na segunda fase da discussão, com a reforma tributária sobre renda e patrimônio, por meio de projeto de lei. “Nós não queremos misturar emenda constitucional com projeto de lei. Vai confundir. É possível tomar medidas pontuais em relação à justiça no Imposto de Renda, ajustes que precisam ser feitos, mas uma reforma tem que vir depois da emenda constitucional”, explicou.
O ministro disse que não está nos planos do governo discutir a volta de um imposto nos moldes da Contribuição Provisória sobre Movimentação Financeira (CPMF) e que o Simples Nacional será preservado no debate.
Indagado sobre a relação entre a reforma e a agenda de sustentabilidade, disse que a reforma tributária terá dispositivos de “seletividade”, para dosar as alíquotas com base na externalidade de cada atividade.
“Aquilo que tiver externalidade positiva pode ser contemplado por alíquotas menores, sobretudo na questão ambiental, e as negativas também, como é o caso do fumo, que já tem imposto seletivo e vai ser mantido no escopo da reforma”, comentou o ministro.
Haddad disse que os mecanismos permitirão onerar ao longo do tempo setores como bebidas, fumo e combustíveis fósseis. Ao mesmo tempo, setores como energia eólica, solar e hidrogênio verde, que podem ser vetores para a transição energética, poderão ter alíquotas menores.
E lembrou que a proposta trabalha com a criação de um fundo de desenvolvimento regional e defendeu o imposto cobrado no destino. “Essa agenda está no radar. Mas, de novo: a reforma tributária é uma porção de chavinhas que você está mexendo. Se você só olhar para o que vai perder, e não olhar para o que vai ganhar, vai inviabilizar a reforma”, disse.
(com Agência Estado)
Fonte: Info Money
Foto: Diogo Zacarias/Ministério da Fazenda